Natureza Jurídica do Zoneamento; Efeitos
The Legal Nature of Zoning Ordinances – Effects
Resumo
I – Introdução1. O adensamento dos núcleos populacionais e a complexidade da vida urbana decorrente do progresso tecnológico, propuseram, de forma inadiável, o problema de organizar racionalmente o uso do espaço onde se assentam as cidades.
Deixando de lado as possibilidades de utilizar intensamente esta organização do espaço como fator global de progresso, o certo é que, na atualidade, ela é indispensável para ensejar condições de vida pelo menos razoáveis nos centros urbanos e para impedir a deterioração das qualidades ambientais ainda presentes.
Daí a necessidade de repartir a área urbana (e as previstas como urbanizáveis) em zonas delimitadas e categorizadas em vista de suas utilizações, obstando dessarte usos incompatíveis com as destinações reconhecidas para cada qual. Esta imposição da realidade ecoou no Direito, mediante o instituto jurídico do zoneamento.
II – Conceito de Zoneamento
2. Denomina-se zoneamento à disciplina condicionadora do uso da propriedade imobiliária mediante delimitação de áreas categorizadas em vista das utilizações urbanas nelas admitidas.
De conseguinte, por tal meio, mapeado o espaço municipal, fixam-se as destinações de uso possíveis nas várias zonas em que se reparte a urbe e sua esfera de expansão, com o fito de assegurar condições e qualidade ambientais de vida satisfatórias.
3. Contudo, a simples divisão do espaço e correlata ubicação das tipologias de uso, para cumprir as finalidades que as determinam, exigem precisões maiores. Realmente, a própria variedade de usos concebíveis (residencial, comercial, institucional, industrial e misto) só ganha configuração funcional, perante os objetivos do zoneamento, em vista de outros fatores que servem para precisar-lhes especificadamente a fisionomia. Assim, por exemplo, a taxa de ocupação do lote, a relação entre a área do terreno e área suscetível de ser nela construída, irão normalmente influir sobre a índole do uso residencial ou da específica destinação comercial que poderá ter.
Em suma: a mera natureza do uso admitido é um dado ainda insuficiente para a definição exata das funções cabíveis em cada zona ao lume da própria razão de ser do zoneamento.
4. Por tudo isto, no zoneamento são contemplados entrelaçadamente as naturezas de uso, os coeficientes de edificação, as taxas de ocupação, os recuos exigidos das construções, sejam fronteiros, laterais ou de fundos, as dimensões de lote, o alinhamento, vale dizer: o afastamento da edificação em relação à via pública e outros fatores que concorrem para dar completa e real identidade ou sentido da cidade em zonas.
III – Natureza jurídica das normas de zoneamento
5. O plexo de normas concernentes a estas várias questões, ou seja, o conjunto de preceitos que as regula, suscita uma série de problemas jurídicos. A solução deles há de ser dada, como é natural, frente aos distintos direitos positivos, mas entronca-se em uma questão básica, qual seja: a natureza das restrições assim estabelecidas e sua compatibilização com o direito de propriedade.
Deveras, e por todos os títulos evidente que a disciplina em causa implica forte condicionamento ao uso da propriedade. Demais disso, cumpre ressaltar que se se é óbvia sua interferência com a propriedade, não menos certo é, que, por via dela, também se fricciona a liberdade. Isto pela circunstância curial de ser a primeira uma possível expressão da segunda, e pela razão menos saliente de que ditas normas restringem a liberdade de eleger, ao próprio alvedrio, onde se quer residir, onde se quer exprimir a liberdade de comércio, de prestar serviços, de fazer indústria, etc.
6. Donde, em rigor, o tema cogitado radica-se na intimidade do panorama amplo das limitações administrativas à esfera de ação individual. Estas, no Estado de Direito, para serem legítimas, têm de assujeitar-se a coordenadas bastante precisas. O assunto em pauta insere-se na temática do chamado Poder de Polícia noção que, ao nosso ver, inobstante o repúdio que lhe fazem autores do porte de Augustin Gordillo2, uma vez que devidamente precisada, nem abarca conteúdo excessivamente fluido, e por isso carente de funcionalidade, nem absorve ressaibos de autoritarismo do Estado Polícia. Trata-se, apenas, de configurá-la em termos ajustados ao Estado de Direito.
7. Entendemos por Poder de Polícia o conjunto de intervenções estatais, caracterizado pela imposição de deveres de abstenção, que delimita o exercício da liberdade e da propriedade a fim de condicioná-las ao bem-estar social. Tomada a expressão em sua amplitude máxima abrange tanto medidas legislativas quanto as providências da Administração a elas complementares.
É de notar que o direito norte-americano, conforme acentua Caio Tácito3, vale-se da terminologia Police Power prevalentemente para referir as normas legais que têm por objeto o conteúdo indicado. Estamos em que, para referir o conjunto de regras e atos administrativos, ou seja, atos produzidos pela Administração – uns e outros necessariamente supeditados em lei – é preferível usar designação “Polícia Administrativa”, suprimindo-se a anteposição da palavra “Poder”, consoante oportuna recomendação de Adilson Dallari4.
8. Cumpre acentuar que no Estado de Direito quaisquer condutas da Administração e assim, também, inclusivamente as expressivas de Polícia Administrativa, assujeitam-se ao princípio da legalidade. Graças a ele devem manter com a lei uma relação tanto de não contrariedade como de conformidade. Por conseguinte devem, sobre não infringir lei alguma, estar subsumidas em lei que as preveja, impondo-as ou autorizando-as, conforme o correto magistério de Renato Alessi5. De resto, a posição da Administração em face da lei foi magistralmente sintetizada pelo mestre luso Afonso Rodrigues Queiró nos seguintes lapidares termos: “a atividade administrativa é uma atividade de subsunção dos fatos da vida real às categorias legais”6.
9. Finalmente, impende acentuar que, em nosso modo de ver, o característico das limitações à liberdade e à propriedade, que perfazem o “Poder de Polícia”, é a imposição de deveres de abstenção, traço sublinhado com muito acerto Santi Romano7.
A essência, pois, da “Polícia”, quer expressada em normas legais, quer exprimida nos atos administrativos que as complementam – e assim, portanto, a essência das disposições que compõem o zoneamento – reside na estatuição de um non facere.
10. Por meio delas o Estado não exige que se lhe preste alguma coisa. Não reclama que se lhe dê coisa alguma, mas tão-somente inibe atuações positivas dos administrados. Veda-lhes dadas condutas, mas não as impõe. Coarta a livre atuação dos sujeitos sem sacar-lhes algum procedimento em seu favor. E, nesse sentido, as limitações em geral, nelas se incluindo, então, as limitações administrativas à propriedade, correspondem ao exercício de um poder negativo, isto é, que nega, que veda, que proíbe.
Segundo entendemos, não é por via deste instituto que o Estado pode reclamar em seu favor prestações positivas dos administrados. A exigência de prestações afeta muito mais profundamente a liberdade e há de ser tratada com cautelas e restrições maiores, tais como as encontradiças no instituto da requisição, meio jurídico que, por excelência, cogita dos deveres administrativos de prestar algo em favor do Estado.
11. Assim, ubicamos o instituto do zoneamento dentro do gênero “limitações administrativas” ou seja, no campo que entendemos coincidente com a noção de “Poder de Polícia”. Já as providências administrativas necessárias a tornar efetivo o disposto na lei de zoneamento incluem-se na esfera da “Polícia Administrativa”.
12. Fixados estes pontos, cumpre determo-nos sobre a compatibilização destas normas limitadoras e, pois, do zoneamento com o direito de propriedade. As conclusões que ao respeito vierem a ser firmadas, servirão, de seu turno, como premissas teóricas para o exame de alguns problemas concretos suscitados pelo zoneamento, a serem examinados mais adiante.
IV – Zoneamento e direito de propriedade
13. O direito de propriedade, nos países que o reconhecem, descende diretamente das instituições constitucionais e com frequência nestas está consagrado de modo expresso e específico. A Carta Constitucional do Brasil, por exemplo, ao arrolar direitos e garantias individuais, estatui no art. 15, § 22, que é garantido o direito de propriedade, salvo desapropriação por necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, mediante indenização justa.
14. Cumpre frisar que a noção de propriedade só assume contorno jurídicos, isto é, só se categoriza como “direito” de propriedade, com o delineamento dos podres atinentes ao proprietário e correlatas limitações. É dizer: o direito de propriedade é o resultado do regime constitucional e legal da propriedade.
Nisto nada há de peculiar, posto que noção de “direito” postula a ideia de limitações, de contenções. O direito de propriedade, então, é a expressão jurídica da propriedade, o que equivale a dizer que é a propriedade tal como configurada em um dado sistema normativo. Daí a procedente observação de Alessi, segundo quem, em rigor lógico, não existem limitações ao “direito de propriedade”. Estas simplesmente compõem o perfil, o desenho normativo dele, ou, com as palavras do autor citado, correspondem “apenas a uma definição do mesmo, uma aposição de seus necessários confins”8.
Segue-se que a expedição de tais normas corresponde ao normalíssimo procedimento conatural à função que ao Estado assiste e conatural à própria ideia de Direito.
Uma vez que zoneamento corresponde a limitações administrativas e sendo elas o próprio delineamento do direito de propriedade resulta que, ao expedi-las ou modificá-las, o Estado não ofende a esfera jurídica de ninguém, mas apenas a configura, tal como aceita em dado sistema normativo.
15. Desta premissa fundamental decorrem alguns princípios básicos.
O primeiro princípio é o de que só compõe o zoneamento, possuindo tipologia de limitações, os dispositivos que tenham caráter geral abrangendo uma categoria de bens, ainda que qualificados por sua ubicação especial, contando que tal ubicação não seja singularizadora. De fato, o perfil de um direito, a esfera juridicamente protegida dos indivíduos, não pode ser definida casuisticamente, mas há de ser disposta para a comunidade de pessoas que se encontram em igual situação. Daí que o zoneamento terá de traduzir-se em disposições tipificadas por este caráter.
Então, não é por limitação administrativa, não expressa regra de zoneamento e nem se caracteriza como desenho tipológico de um direito, a providência concreta e específica adotada pelo Estado em relação a alguma propriedade singularmente considerada. Se o Poder Público a atinge especificamente estará interferindo no próprio direito. Haverá invadido a esfera jurídica delineada e vigente, com atribuir a um dado bem tratamento diverso do regime geral de propriedade, aplicável aos imóveis submissos à disciplina comum.
Se isto ocorrer, estar-se-á, no caso, perante outro instituto: o do sacrifício de direito. Nesta hipótese ocorrerá agravo a ele e não simples formulação de seu âmbito de expressa legítima. A desapropriação e a servidão bem revelam esta figura.
16. Um segundo princípio a ser mencionada é o que de que, se a Constituição garante a propriedade ou o direito de propriedade, as disposições inferiores que o regulem, como zoneamento, não são limitadas, pois não podem atentar contra o que há de ser essencial no direito de propriedade.
Deveras, descabe mediante zoneamento, a título de compor a fisionomia normativa do direito de propriedade, desfigurar o que haja de inerente à sua existência. Então, embora às normas infraconstitucionais caiba delinear o direito em apreço, não lhes é dado pretender fazê-lo em termos tais que lhe suprimam atributos indispensáveis.
Com efeito, é forçoso reconhecer que as palavras vasadas na Constituição – como em qualquer disposição normativa – por mais vagas, fluidas ou imprecisas que sejam, têm um conteúdo, uma significação mínima, determinável no tempo e no espaço. Se não o tivessem seriam meras inconsequências, faltando-lhes a qualidade de signos e, pois, de palavras. Ao serem pronunciadas corresponderiam simplesmente a ruídos inexpressivos, sons ocos ou de alcance incognoscível.
17. Segue-se que a proteção constitucional à propriedade implica uma barreira para os órgãos infraconstitucionais. Mesmo sem negar, de modo algum, a historicidade dos conceitos jurídicos, graças ao que seu âmbito de abrangência pode alargar-se ou restringir-se, o certo é que o sentido mínimo atribuível à expressão propriedade está ligado às ideias de uso, gozo e disposição da coisa.
Estes três atributos podem, sem dúvida, sofrer condicionantes e até mesmo muito fortes. Aliás, em nome do interesse social e da função social da propriedade, consagrada implicitamente em algumas constituições ou explicitamente, como na Carta Constitucional do Brasil (art. 160, III), estas compreensões vão se tornando e têm que se tornar cada vez mais intensas e pronunciadas. São fruto das contingências da vida moderna e em particular dos fatores, já aludidos, atinentes ao convívio urbano.
Sem embargo, se a disciplina deles incrementar-se ao ponto de sacrificar o uso, o gozo ou a disposição do bem, reduzindo-o a uma esfera inexpressiva ou nula, ter-se-á de concluir que foi golpeado o próprio direito, a pretexto de regulá-lo. É que sem as expressões dele não há o direito em si mesmo.
Em suma, a título de zoneamento não se pode anular ou paralisar as manifestações do direito de propriedade.
18. Aqui é necessário um esclarecimento para atribuir conteúdo mais denso e explicito ao que se vem de dizer. Cumpre precatar-se contra o risco de supor que o conteúdo da propriedade confunde-se com a significação patrimonial ou econômica dela. Ambas as coisas podem estar, como geralmente estão, bastante interligadas. Nem por isso se confundem.
O que às normas de zoneamento é interdito ferir, dado seu caráter de limitações administrativas, é o conteúdo nuclear do direito. Não se disse nem se dirá que lhes seja vedado acarretar consequências economicamente gravosas aos proprietários. Nem se disse que tal sucesso obrigue a indenizar prejuízos dessarte provocados. O dever de indenizar só surgirá se, concomitantemente, for atingida a essência do direito. E existirá por causa de havê-lo atingido.
19. O uso e gozo do bem são noções cuja substância esta indissoluvelmente ligada à ideia de funcionalidade. Logo, o que não se lhes pode retirar é a funcionalidade. Entende-se por funcionalidade a aptidão natural do bem em conjugação com a destinação social que cumpre, segundo o contexto em que esteja inserido. É isto que o Direito quer proteger quando consagra, constitucionalmente, o direito de propriedade.
Logo, as limitações administrativas de zoneamento não lhe podem subtrair este caráter. É-lhes proibido fazê-lo, não porque com isto lhe estejam reduzindo a expressão econômica, mas pela circunstância de amesquinharem ou anularem o que o direito defere e alguém.
Segue-se do exposto que se o Estado vedar edifico em imóvel sediado no interior de um núcleo urano haverá elidido seu uso funcional, ainda que permita, no mesmo imóvel, utilização agrícola. Com efeito, o uso funcional é aquele compassado tanto com suas aptidões naturais, como com suas destinações comuns ou preponderantes. Não vêm ao caso usos não plausíveis ou secundários. Por esta razão não aceitados que o direito de construir no meio urbano possa ser definido pelo Estado, sem ofensa à proteção constitucional da propriedade, como direito dele distinto.
Assim, também, não seria tolerável que o Poder Público proibisse atividade pastoril em imóvel rural imprestável para atividade agrícola satisfatória, sub color de que não elidiu usos alternativos.
20. Poder-se-ia supor que o agravo ao direito da propriedade nas hipóteses figuradas é censurado por implicar agravo econômico, em cujo aspecto residiria a essência da proteção jurídica. Tal suposição, entretanto, seria inexata.
21. Desde logo, se procedesse a tese profligada não se teria como explicar porque a desapropriação, inobstante processada com justa indenização, isto é, mantendo intacta a expressão patrimonial do sujeito passivo, é considerada um sacrifício de direito ao invés de simples delimitação de sua esfera. Isto é suficiente para ressaltar o claro discrímen entre o direito de propriedade em sai e a falta de expressão patrimonial dele. Mas serve, ainda, para desvelar duas outras realidades: a primeira é de que só há correlação incindível entre o direito e seu significado econômico quando a ordem jurídica legitima o Estado o amesquinhar ou aniquilar o direito, compensando o lesado mediante indenização. A segunda é a de que só cabe indenização quando o atingido é o direito e não apenas seu alcance patrimonial.
22. Por isso, frequentemente as limitações administrativas estabelecidas no zoneamento acarretam alterações patrimoniais detrimentosas para os proprietários, mas, por serem verdadeiramente limitações e deixarem incólumes o direito, não ensejam indenização, nem são juridicamente objetáveis.
Basta pensar-se em zoneamento que altere a destinação anterior de uma área, passando-a de residencial para comercial ou vice-versa. A mudança em causa pode significar desvalorização dos lotes não edificados ou já edificados. Idem, quando se alteram, para menos, os coeficientes de edificação admitidos. Nem por isso o direito de propriedade é atingido. Conservado seu uso, gozo e disposição funcionais ou plausíveis, não há ofensa a direito, mas, tão-só, delineamento de seu âmbito, motivo por que descabe qualquer indenização, embora seja produzido efeito econômico desvalizador.
23. Estas considerações, do mesmo passo em que demonstram que o protegido constitucionalmente é a funcionalidade de uso, gozo e disposição do bem – conteúdo essencial da propriedade — e não sua mera significação econômica, apontar para um terceiro princípio, implicado e expressado no que se acaba de anotar. É dizer: as medidas de zoneamento, por serem limitações administrativas, em se mantendo assim, apenas configuram o direito, definindo-lhe o âmbito de expressão válida. Por isso não são indenizáveis, já que não o ofendem. Pelo contrário: compõem seus contornos.
Diverso caso ocorre nos sacrifícios de direito. Nestes, permanecendo vigentes as regras conformadoras do direito de propriedade, o Estado investe contra a situação jurídica protegida e comprime ou aniquila o direito; bem por isso é obrigado a indenizar.
24. Assim também, a igual conclusão ter-se-á que chegar quando o impacto de regras legitimas de zoneamento sobre alguma ou algumas situações concretas implicam, em casos particulares, inibições que soneguem funcionalidade ao uso, gozo e disposição do bem. Em tal caso, conquanto constitucionais em sua generalidade, e por isso inobjetáveis quanto à validade, haverão gerado sacrifício de direito, por implicarem expropriação do uso funcional do bem. Aí, então, emergirá, para o lesado, o direito a ser indenizado.
25. O quarto e fundamentalíssimo princípio é o de que as limitações administrativas e, portanto, o zoneamento, só podem derivar de lei. E lei formal. Esta assertiva é inquestionável, pelo menos nos ordenamentos em que o princípio da legalidade foi acolhido em toda a sua extensão, como sucede no caso do Texto Constitucional brasileiro.
Realmente, quem pode definir direitos dos indivíduos é a lei e não o ato administrativo. Toda a atividade administrativa é infralegal, subordinada, e ademais dependente de lei. Uma vez que o zoneamento traz consigo uma delimitação do direito de propriedade, ou dito com maior rigor, uma vez que o zoneamento delineia o próprio direito, entregar este poder à Administração corresponderia a subverter as razoes que inspiram o Estado de Direito e que geraram o princípio da legalidade. A matéria em pauta é eminentemente matéria de lei.
A Administração não poderia intercalar-se entre uma garantia constitucional e o indivíduo para gizar o âmbito de expressão desta garantia.
26. Com esta assertiva não se quer, entretanto, excluir a hipótese de que a lei defira à Administração a possibilidade de incluir, por ato seu, as áreas tais e quais sob regime tal ou qual. Mas cumpre que em lei se estabeleçam as distintas possibilidades de utilização da propriedade, as condições regedoras nas diversas situações e os pressupostos objetivos autorizadores das inclusões. Isto é, pode assistir à Administração o reconhecimento in concreto da ocorrência dos pressupostos fáticos objetivamente estabelecidos em abstrato como exigentes da inclusão de uma dada área sob o regime previsto.
Fixados os princípios básicos em matéria de zoneamento, cumpre mencionar, ainda que de modo breve, os instrumentos de que se vale a regulação zoneadora.
V – Instrumentos das normas de zoneamento
27. Os principais meios de que se vale a disciplina zoneadora são os seguintes: a) delimitação das áreas e categorização dos tipos de uso; b) fixação de dimensões mínimas dos lotes; c) fixação dos coeficientes de edificação admitidos em cada área; d) fixação das taxas de ocupação das distintas áreas de uso; e) fixação de recuos fronteiros, laterais e de fundos.
28. Pela delimitação de áreas divide-se o espaço urbano em zonas, categorizadas a partir do tipo de uso nelas admitido. Fundamentalmente, os usos sem classificar-se em uso residencial, uso comercial, uso institucional, uso industrial e uso misto. A partir destas tipologias formulam-se combinações e contemperamentos.
Assim, podem haver zonas exclusivamente residenciais e zonas residenciais em que se admitia comercio local de pequeno porte; zonas comerciais, em que se admita uso residencial do comerciante; zonas mistas de comercio e residências; zonas mistas de comercio e indústria; zonas mistas de residências, comercio e indústrias de pequeno porte e assim por diante.
Obviamente a variedade de combinações possíveis relaciona-se com as condições locais.
No Município de São Paulo, por exemplo, há dezoito zonas de uso e seis chamados “corredores”. Estes, de regra, nada mais são que faixas estreitas intercaladas entre zonas de uso de características bastante diversas, servindo como gradação na passagem de uma tipologia para outra.
Outrossim, a zona estritamente industrial, suposta na legislação de zoneamento do Município de São Paulo, só tem existência teórica, pois, em termos reais, o que existem são zonas predominantemente industriais. Estas abrangem 5,5% da área urbana. As zonas estritamente residenciais da cidade absorvem 4,38% da área urbana. Já as zonas de uso predominantemente residencial, de densidade demográfica baixa, e que comportam alguns usos comerciais, industriais de pequeno porte e institucionais, correspondem a 65,38% da área urbana.
29. É bem de ver que as tipologias de uso só assumem feição especificada em vista de outros fatores, como o coeficiente de edificação e taxa de ocupação, os quais são responsáveis pela possibilidade de adensamento demográfico ou pela espécie de comércio ou indústria suscetíveis de se implantarem no local.
Por isso se disse, inicialmente, que o zoneamento não pode ser concebido apenas em função da delimitação de áreas, vez que a variedade de usos a partir de uma categorização básica é determinada por um conjunto de fatores. É o que melhor se esclarece ao mencionar os itens subsequentes.
30. O estabelecimento de dimensões mínimas para os lotes visa, sobretudo, impedir que uma especulação imobiliária desabusada venha a gerar condições da habitualidade extremamente desfavoráveis. Mas serve também para incentivar o surgimento de lotes de grande extensão, quando o mínimo é fiado em nível muito alto, tendo em vista preservar, em certas áreas, condições ecológicas satisfatórias.
É fácil percebe-se a importância da definição das dimensões mínimas do lote, pois os coeficientes de edificação e as taxas de ocupação, calculados sobre ele, é que irão determinar as características da cidade.
No Município de São Paulo a menor área do lote, admitida no espaço urbano, corre em algumas zonas estritamente residenciais e é de 100 metros quadrados, com o mínimo de 5 metros de frente. Já em outra zona estritamente residencial, localizada na faixa de preservação de recursos hídricos, exige-se área mínima de 5.000 metros quadrados para o lote.
31. Coeficiente de edificação ou coeficiente de aproveitamento é a relação entre a área edificada total e área do terreno. O estabelecimento de um coeficiente máximo admitido é fator de fundamental relevo para propiciar ou inibir o adensamento demográfico, com a verticalização ou horizontalização, em dada zona.
Evidentemente, quando o coeficiente de aproveitamento é alto incentiva-se a construção de prédios de apartamento e se favorece, nas zonas de utilização mista, o surgimento de comercio de grande porte. Quando, reversamente, o coeficiente é baixo, inibem-se tais construções, propiciando-se apenas residências unifamiliares horizontais, comércio local e serviços de pequeno porte.
No Município de São Paulo, o menor coeficiente de edificação é de 0,12%, em áreas estritamente residenciais nas quais a dimensão mínima do lote é de 5.000 metros quadrados. Foi estabelecida com o intuito de estimular “chácaras urbanas”, em glebas não urbanizadas, lindeiras à zona rural e que se encontram sediadas dentro da faixa de proteção aos mananciais, pretendendo-se, com isto, protegê-los e conservar, ao máximo possível, as condições naturais de topografia e vegetação.
O maior coeficiente de aproveitamento é de quatro vezes a área do lote, o que é permitido na zona metropolitana central e em certos subcentros, ou centros de bairro. De regra, este coeficiente máximo só é permitido com a redução da taxa de ocupação do lote.
32. Taxa de ocupação é a relação entre a área de construção, em sua projeção horizontal, e a área do lote. As baixas taxas de ocupação favorecem a preservação de espalho aberto, concorrem para evitar o adensamento e propiciam que na cidade se mantenham espaços verdes por obra dos próprios proprietários.
A maior taxa de ocupação permitida na área urbana do Município de São Paulo é de 80% da área do lote e vigora nas zonas de uso misto, localizadas no centro metropolitano e em centros de bairro. A taxa de ocupação mais exigente é que a inadmite ocupação superior a 12%, isto é, 012 da área do lote e está prevista para certas zonas residenciais caracterizadas por lotes de grande extensão.
33. Os recuos fronteiros, laterais e de fundos são afastamentos em relação às divisas do lote, vale dizer, em relação ao alinhamento da via pública, que compõe o recuo fronteiro, e em relação aos outros lotes confinantes.
A fixação dos recuos mínimos tem evidentes repercussões no aproveitamento do lote e, por isso, concorre também para influir tanto no adensamento da zona, quanto na reserva de espaços livres.
A menor imposição de recuo mínimo, na legislação paulistana, é de 50 metros de frente e 1,5 metros em um dos lados. A maior imposição é de 10 metros em todas as divisas.
VI – Problemas jurídicos propostos pelo zoneamento
34. Entre as várias questões que a aplicação das normas de zoneamento têm provocado, pode-se salientar cinco tipos de dificuldades correntes.
A saber: a) Qual o ato ou fato que investe o proprietário no direito de edificar sob o império de uma dada legislação de zoneamento, esquivando-se às alterações subsequentes? b) É ou não possível à Administração cassar licença de edificação, fundada em que houve alteração legislativa subsequente? c) É ou não possível à Administração cassar licença de funcionamento de atividade comercial ou de prestação de serviços, em razão da alteração de uso estabelecida para a zona onde se situa o imóvel? d) Coeficientes de aproveitamento muito baixos ou recuos muito grandes estabelecidos no zoneamento obrigam ou não o Poder Público a indenizar os proprietários dos lotes atingidos? e) Novo alinhamento de via pública, pela implicação que tenha no recuo fronteiro, obriga ou não a indenizar os proprietários dos lotes afetados?
35. A todas estas questões pode-se dar respostas de relativa singeleza, uma vez aceitos os princípios anteriormente apontados. Deveras, as raízes teóricas implantadas oferecem solução a estes vários problemas. A aplicação deles fornece os elementos necessários ao deslinde das dúvidas que suscitam.
Vejamos.
36. Por forço das normas de zoneamento, quem deseje edificar deverá previamente demonstrar à Administração que o fará na conformidade das regras estabelecidas. Daí a necessidade de obter a competente licença de edificação, cuja expedição é obrigatória, caso o postulante exiba planta ajustada aos requisitos exigidos para a zona em que se sedia o bem.
a) Momento em que se fixa a legislação aplicável.
37. Trata-se, pois, de saber se a legislação a ser aplicada será a vigente no momento em que é feito o pedido de licença ou no momento em que é deferida, ou no momento em que se inicia a edificação. É óbvio que a própria lei pode oferecer resposta a esta questão, caso em que, evidentemente não se oporá nenhum problema. A dificuldade surge, precisamente, ante o silêncio das normas.
Estamos em que, no silêncio delas, a solução derivada das premissas teóricas que foram propostas há de estribar-se no seguinte raciocínio.
A possibilidade jurídica de edificar não se fundamenta na licença, mas nas leis que regulam o direito de construir. A licença não é ato que define o direito vigente, mas, apenas, que remove obstáculo jurídico ao exercício de um poder suscetível de ser exercido se e enquanto conforme à lei. Logo, descaberia supor que o direito a erigir se assegure a partir da expedição da licença.
Com efeito, à licença expedida pela Administração faltaria força jurídica para gerar situação sobre a qual não têm disponibilidade, já que sua função resume-se em reconhecer a coincidência da pretensão com a lei ou a descoincidência com os termos na lei estipulados. Esta ausência de titulação jurídica da Administração para compor os termos dentro nos quais seria cabível ou incabível a construção pretendida, descarta a possibilidade de que se possa fazer gerar um direito, pois é estranha à configuração dele.
38. De outro lado, a possibilidade de construir, garantida no direito objetivo, tal como a possibilidade de casar-se ou divorciar-se ou a possibilidade de comerciar ou de frequentar dados locais, são especificamente poderes jurídicos. Daí, que só assumem a forma de direitos concretizados, nos termos das leis vigentes, quando efetivamente exercitados. Embora alguém possa casar-se hoje, ou divorciar-se hoje, ou exercer dada atividade de comércio, enquanto não os exercita permanece no reino das possibilidades. No momento em que efetivamente o fizer concretizará uma dada situação e terá que fazê-lo nos termos das leis vigentes. Por esta razão, também descaberia supor que o mero pedido de licença tenha a força jurídica de assegurar o império de uma dada legislação, excluindo a aplicação da lei nova. Além do mais, pelos motivos anteriormente expostos, o pedido de licença não poderia ter a virtude que nem mesmo à própria licença se pode reconhecer.
39. Mediante pedido de licença alguém manifesta a intenção de fazer valer um “direito”, ou, mais propriamente, de um poder jurídico, mas certo é que ainda não o efetivou, até porque dependia da remoção de um obstáculo jurídico para concretizá-lo. Segue, pois, que o direito a edificar sob dada legislação, só se concretiza quando efetivado, vale dizer, quando realmente iniciada a obra. É este fato jurídico que investe o proprietário no direito a executá-la segundo aquela lei então em vigor e coloca o imóvel a salvo de sujeição às regras supervenientes.
40. Contudo, se houver mora da Administração na apreciação do pedido de licença e forem ultrapassados os prazos legais, há de reconhecer-se, ao pretendente, a consolidação do seu direito na conformidade da lei do tempo do pedido, se esta estava em vigor no último dia do prazo dentro no qual a Administração devia se pronunciar. É que a ilegalidade administrativa não pode ser obstáculo à aquisição do direito.
b) Cassação de licença para edificar
41. A resposta oferecida à primeira questão antecipa a resposta quanto à possibilidade de cassação de licença para edificar fundada em alteração legislativa. Os mesmos fundamentos teóricos que lhe governam a solução, comparecem neste segundo problema. Dado que o direito a edificar sob o império de certa lei só se entende consolidado quando iniciada a construção, tem-se que a licença para construir pode e deve ser cassada, se sobrevier lei nova antes de iniciada a construção.
42. Isto, contudo, não exclui indenização pelas despesas efetivamente realizadas com o projeto de construção ou imediatamente ligadas ao desencadeamento de províncias para executá-la, pois o proprietário já havia removido, com a obtenção da licença, o obstáculo jurídico ao início da obra.
Entretanto, não lhe caberá indenização pelos efeitos que decorram das novas condições legais a que se assujeitará o imóvel, isto é, pela eventual desvalorização oriunda das novas regras que vigerão na zona onde se sedia o bem.
43. Reversamente, se a obra houver iniciada, a Administração não poderá cassar a licença, pois terá havido concretização do direito objetivo e estará consolidada a situação jurídica. Em havendo grave incompatibilidade entre a obra em andamento e as regras novas, a solução residirá na expropriação, não necessariamente do bem, mas apenas do direito a edificar pela destinação antiga ou segundo as anteriores condições de aproveitamento, conforme o caso. É que desassiste à Administração optar simplesmente pela cassação já que isto equivaleria a lançar o administrado em via mais trabalhosa, qual, a de mover ação de indenização. Incumbe a ela assumir o encargo de buscá-lo em juízo para efetuar a desapropriação9.
c) Cassação de licença de funcionamento
44. Na hipótese de alteração da tipologia de uso admitida em certa zona, as atividades comerciais, industriais ou de serviço, devidamente licenciadas, em princípio devem ser havidas como garantidas contra alterações subsequentes e a salvo de cassação da licença, pelas mesmas razões já aduzidas.
Se é certo que as licenças de funcionamento de comércio, de indústria ou de serviços, não se confundem com as licenças para edificar, não menos certo é que as atividades em questão são desenvolvidas em construções erigidas em função do tipo de uso e por isso a ele ajustadas. Ora, de nada valeria considerar garantido um tipo de edificação, se lhe for negada a utilização correspondente.
45. ressalvam-se, apenas, os casos em que ao tipo de construção sejam indiferentes as modalidades de uso, por compatibilizar-se perfeitamente com utilizações alternativas.
46. Cremos que estas mesmas soluções, por iguais razões, hão de ser dadas na hipótese de mudar o ocupante do imóvel. Conquanto a licença para exercício de dada atividade comercial, industrial ou de serviços, tenha caráter pessoal, a licença para edificar é de caráter real; vale dizer, adere ao bem, pois diz respeito ao imóvel e não ao proprietário.
Sendo assim, quando o imóvel não se preste a uso alternativo, negar licença de funcionamento para uso correspondente à tipologia da construção regularmente erigida, equivaleria a aniquilar o sentido já consolidado na licença de edificar. Em se prestando o imóvel a uso diverso, aí sim seria cabível recusar licença de funcionamento para uso desconforme ao previsto na legislação vigente.
d) Inaproveitabilidade do bem em decorrência do zoneamento
47. Quando a legislação de zoneamento prevê coeficientes máximos de edificação muito baixos, ou recuos muito grandes, pode ocorrer que, pela situação peculiar de certos lotes, estes se tornem totalmente inaproveitáveis ou praticamente inúteis. Isto sucederá quando as regras incidem sobre lotes muito pequenos ou de configuração desfavorável.
Nestes casos, dado que o uso funcional deles fica aniquilado ou reduzido a condições inexpressivas, tem-se verdadeiro sacrifício de direito, ante a supressão de seu uso ou gozo funcional. Sempre que ocorra tal hipótese, já prefigurada no curso desta exposição, não mais se poderá considerar que o zoneamento apenas compôs o perfil do Direito. Será forçoso reconhecer que implicou, nestas situações concretas, em elisão de atributos essenciais do direito; vale dizer, em autêntica lesão a ele. Por haver suprimido um bem constitucionalmente protegido, o Estado terá que indenizar o lesado, procedendo à conversão do direito afetado na expressão patrimonial que o compense.
e) Repercussão do alinhamento na utilização do lote
48. Quando sobrevém novo alinhamento da via pública, tal ato traz consigo manifestação de que a Administração pretende incorporar ao domínio público a faixa fronteira dos lotes alcançados pela demarcação.
Sem embargo, esta expressiva manifestação de intenção não tem, nem pode ter, força jurídica para demitir os proprietários de sua titulação sobre os bens afetados. Em vista disso, se os recuos passam a ser contados a partir do novo alinhamento, resulta que os proprietários sofrem perda na utilização de uma faixa que lhes era utilizável, pois ocorre uma indireta suplementação do recuo. Tendo-se em conta que a finalidade do alinhamento atende a interesse público de dada ordem e que o recuo satisfaz interesse público de outra ordem, pois não são prepostos ao atendimento dos mesmos fins, estamos em que o Poder Público fica obrigado a indenizar os proprietários agravados.
49. Com efeito: não se pode atender a uma finalidade, embora pública, mediante competência que é, de direito, preordenada ao alcance de outra finalidade. Em suma: as competências não são intercambiáveis, logo não é dado atribuir à competência para fixação de recuos. Embora, no caso, se trate de uma competência legítima – a de estabelecer alinhamento — é incabível atribuir-lhe os efeitos correspondentes ao da competência para fixar os recuos.
50. Deveras, a finalidade do alinhamento só pode ser a de demarcar o espaço que virá a ser ocupado pelo domínio público. A finalidade dos recuos é estabelecer o afastamento em relação à via pública. Já se vê que têm por objetivos diversos. As consequências de uma medida em relação à outra são inerências irrefragáveis, porque impostas pela lógica das coisas, mas, ainda assim, ambos os institutos persistem juridicamente distintos.
51. Ora, se é certo é certo que através da definição dos recuos o Estado pode conformar a expressão da propriedade, certo também é que não pode fazê-lo mediante alinhamento, pois o objetivo deste último não é delinear o campo do direito de propriedade, mas o de sacar futuramente deste campo aquilo que se considera como nele integrado.
52. Não é admissível, então, que o propósito de uma aquisição futura possa, na atualidade e sem indenização, demitir o proprietário de utilizar o bem segundo as condições que lhe correspondem, isto é, nos termos dos recuos existentes a partir da via pública que existe.
Fundado nestas razões entendemos que a Administração não pode exigir que os recuos sejam contados de uma via pública que inexiste, salvo se indenizar o titular do bem pelo fato de já computar como domínio público uma faixa do imóvel do mesmo proprietário.
Maio de 1981.
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